terça-feira, julho 09, 2013

CHAME O DOUTOR!!!!


JAIME SAUTCHUK*

As medidas agora adotadas pelo Governo Federal no campo da Medicina vêm em um momento em que o País já não suporta mais a precariedade do atendimento de saúde. São ações mais do que bem-vindas pela maior parte da população brasileira, mesmo a parcela que mora nos grandes centros urbanos.

Atrair médicos para áreas desprovidas desse serviço, formar mais profissionais, incluir a prática nos currículos universitários, além de construir e equipar mais hospitais e postos de saúde são os objetivos centrais do conjunto de decisões tomadas. E com a abertura de vagas para profissionais estrangeiros, de países que não tenham carência deles, o que é medido pela densidade de médico por habitantes.

A ausência de médicos não é apenas no Nordeste e Norte do País, apesar de a situação ser ainda mais grave naquelas regiões. Mas, em verdade, o problema está bem mais próximo do que se imagina. Dos 252 municípios de Goiás, por exemplo, 68 não têm médico permanente. Sem falar nos distritos de cidades maiores.

Houve gritaria e protestos de entidades que falam em nome da categoria, quando deveriam ser elas as primeiras a atentar para um drama que é evidente. Deveriam, no mínimo, sentar com o governo para ajudar na tarefa de fazer o atendimento chegar mais próximo de quem precisa dele, esteja onde estiver.

O Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp) chegou a pagar horas extras e bônus de taxi para seus funcionários vestirem branco e irem a uma manifestação que seria de médicos, na Avenida Paulista. A convocatória vazou na Internet, Brasil afora, desgastando o movimento. Uma vergonha.

Vale lembrar que a maior parte dos médicos brasileiros é formada em universidades públicas ou se utilizam de auxílios oficiais. Ou seja, estuda com dinheiro do povo. Mas, ao se formar, vai logo trabalhar em hospitais privados, até porque a demanda por profissionais dessa área cresce acima da atual capacidade de formação.

Daí vem a decisão de aumentar o número de escolas de Medicina, e de chamar médicos, inclusive estrangeiros, para atuarem no Sistema Único de Saúde (SUS). Até 2015, serão contratados 35 mil médicos e vai duplicar o número de faculdades de Medicina. Na construção de hospitais e centros serão gastos R$ 5,5 bilhões além do já previsto para o ano que vem.

Os currículos dos cursos também sofrerão mudanças, para reforçar a formação generalista dos futuros médicos. A ideia é quebrar a especialização prematura, que boa parte dos estudantes busca, escolhendo a área específica de acordo com o mercado. Ou seja, aquelas especialidades que a rede privada remunera melhor.

Uma justificativa usada pelas entidades que falam pelos médicos é de que as cidades do interior ou postos das periferias não têm estrutura. Em grande parte é verdade, mas eu conheço várias prefeituras que têm postos e até hospitais bem montados, e oferecem bons salários, mas não encontram médicos que queiram ir para aqueles rincões.

Não se espera dos novos profissionais aquela doação quase religiosa, franciscana, que se encontrava em muitos médicos do passado. Mas alguma sintonia com a realidade nacional e uma dose de humanismo são fatores indispensáveis. Por isso, o estágio ou residência de dois anos como parte do curso de Medicina é fundamental.

Não se espera tampouco que de uma hora pra outra a saúde pública brasileira se iguale à de Cuba. Até porque a Organização Mundial de Saúde (OMS) divulgou há pouco novos dados sobre a situação global da saúde pública, país por país, e coloca Cuba no topo do mundo. E o Brasil está lá embaixo na lista.

O segredo cubano está no atendimento preventivo, feito nas casas das pessoas, o que implica ações nos campos da própria higiene e qualidade da água, envolvendo toda a família. Cada equipe, chefiada por um médico generalista tem mil pessoas sob o seus cuidados.

Todos esses pacientes são visitados em casa no mínimo uma vez por ano. O atendimento por especialistas e uma eventual internação entram sempre que necessário, mas nunca como primeiro recurso. Uma experiência bem sucedida com esse sistema de atendimento funcionou aqui no Brasil, no Distrito Federal, quando Cristóvam Buarque foi governador.

Mas, ali mesmo no DF, os principais hospitais estão abarrotados de pacientes procedentes de outras partes do país, de Goiás, Bahia, Tocantins e Piauí, principalmente. Essa migração ocorre em todas as capitais e boa parte dos atendimentos é de primeira mão, pois no mais das vezes o indivíduo malsão chega direto do interior, sem triagem alguma.

Para os médicos vindos de outros países serão feitas algumas exigências. Seus diplomas terão de ser reconhecidos lá, na sua origem. Ao chegar aqui, ele (ou ela) receberá uma autorização de trabalho por três anos. Não será feita a validação do diploma, pois isso daria a ele o direito de exercer a profissão em qualquer parte do país, não apenas no local para onde será contratado.

Terá, de igual modo, que falar português com fluência e se sujeitar à supervisão de alguma das instituições que serão incumbidas dessa tarefa. E, de todo jeito, eles terão de aguardar a chamada de médicos brasileiros pras milhares de localidades beneficiadas. Só depois, os estrangeiros poderão assumir as vagas que restarem.

O importante, como disse a presidente Dilma Rousseff, é que cada cidadão tenha acesso a um médico. Que possa um dia dizer “chame o doutor”, e ele aparecer.

*JAIME SAUTCHUK é jornalista, vice presidente do Cebrapaz do Distrito Federal, comunista, ambeientalista, humaista e curioso do Mundo e das coisas

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